domingo, 16 de novembro de 2008

16/11/2008

Léguas preenchidas por asfalto seco

E tempo não medido

Mantinham-me em represa, na aridez dos dias.

Fio d’água correu num crepúsculo, percorrendo encostas

Sorrateiro, preenchia os relevos da planície.

Entre a crueza do tempo, das coisas que morrem em sincronia

é permitido em ritmo crescente

acessar o perpétuo; como um cetáceo

que perfura a superfície

e por segundos emerge em atmosfera ideal.

Olhos captam raios, que outrora tocavam altiva figura

E reverberam no vasto espaço, antes oco

Para formar acordes que se desdobram

E compõem um oceano, no qual intuo

Mergulhos rumo ao que não sei.

Mas sei belo.

terça-feira, 21 de outubro de 2008

21/10/2008

Minguado gesticular
Abrigo de incerteza, permanece nos bastidores do palco.
Tua superfície projeta a normalidade que sei fina, película glacial.
Sou alheio no entanto.
A salvo ao perscrutar delicada camada,
Posso deslizar confiante.
A redenção turva suprime linhas, limites.
Durante um intervalo imensurável, há suspensão
A dimensão clássica dos movimentos,
Panejamento e escorço se revelam abruptamente
A solidez é enfim conquistada
E se afirma efêmera com toda sua densidade física.
Minutos além, esta carga sucumbe ao inconsciente;
E volto a ter acesso apenas à obviedade
De uma calçada cinza, um céu difuso.

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

20/10/2008

A empena pintada de branco reflete a luz azulada de lâmpadas frias. De início, se apresentava como uma visão, tal como os momentos sucessivos ao despertar. Quando menos esperava, lá estava a dimensão atemporal; real e veemente, gritando sua esquiva aos nomes, aos recipientes. Contemplava a aridez dos tijolos e planos de concreto, todos uniformizados em cal. Os pontos afastados desta miragem; transeuntes, carros, o banco da praça, conservavam-se imersos na banal meia-luz de tom laranja.
O tato pode parecer tão distante: nunca terei minhas mãos a tocar aquelas paredes, nunca saberei se a textura dos tijolos guarda semelhança com os pórticos das catedrais. Os postes das avenidas nunca serão tocados pelos pés. O centro de quatro focos de luz, formando um “x”, poderia servir de apoio aos pés. Alguém prostrado nesta base, pareceria pequeno em demasia, mas seria capaz de vislumbrar uma perspectiva inédita dos prédios.
Então me conformo com o tato luminoso, responsável por tantos simulacros e suposições de verdades. Não saber o que de fato existe, mas ter claro o que a luz projeta em retina já é quase suficiente.

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

04/08/2008

Uma dissonância se apresentava em seu conjunto. Talvez os olhos girandorbita demasiado e as mãos aflitas (aranha em teia soprada por garoto). O crepúsculo se aproximava junto com a brisa calma, fria. Quando menos pudera notar, sua figura já tinha mergulhado. A grande estrela substituída por uma infinidade de outras menores, - algo inteiro que se dispersa. Dente de leão.
Inversamente ao sol, Gabriella se adensava. Era mais profunda que o escuro, seu interior se expunha sem reflexos, e não havia outra opção além de imergir em lago desconhecido. Silvermoonlake.
De início estatelado, paralisado só de olhar, doei-me tanto que já não inteiro compunha sobrepostas folhas foscas. O que me continha, dei a ela de proteção contra a estaticidade molecular, para que o ar quente ao redor ficasse no seu adiposoveludoazulo. Assim permaneceu por algum tempo, nunca houvera junção tão perfeita.
Espaços suspensos percorremos; trilhas decalcadas em tempo remoto. Logo tudo desapareceria.
Ponto final do itinerário, afobado meio infante. Tomei de volta o casulo e o ar ainda enclausurado no tecido. Vesti o fosco, mais doce que antes, e púrpura.
Depois o ar vazava minguante, comum murmúrio.

domingo, 6 de julho de 2008

06/07/2008

...e ele esperava. Nesses momentos a realidade se resumia às marcas e formas do cimento queimado (paredes e tetos) que se assemelhavam às nuvens onde era possível encontrar personagens, silhuetas e seres ainda não existentes. Esta miríade de universos e mundos inteiros logo será desfeita; se perderá na memória pois é quase intraduzível para qualquer coisa além daquela sensação tautológica (um pouco como a natureza). Mas ainda não.
Neste momento ele conservava-se na quina do pequeno salão, e o ar desenhava seu volume ao redor de seu corpo, e fluía para dentro de seus pulmões. Transfigurava-se nesta rede de traquéias e brônquios até ser parcialmente absorvido. A discrepância da velocidade de troca energética entre suas mãos e o aço e a madeira, fazem-no julgar esses dois materiais como [duro, liso, estéril, desolado] e [mole, áspero, orgânico, acolhedor] respectivamente. Desta forma, opta pela assepsia metálica que em breve torna-se quente, igual ao seu calor.