domingo, 15 de fevereiro de 2009

12/02/2009

Vês a sincronia pluvial?
Duas esferas se precipitam,
uma no rio outra no mar.
As profundezas são incógnitas
e a água da chuva se mistura
com o sal marinho e a terra ribeira,
nublado limite entre distintas matérias.
E assim seguia o rio, e assim ondulava o mar;
de tempos em tempos alagando
suas margens; suas praias.
A nascente fluvial, ainda que distante,
se fazia presente no caudaloso movimento
– e os ecos da nascente eram a essência do rio;
suas verdades mais profundas.
O mar não tinha memória;
já apresentava as partículas do passado
amalgamadas em todas suas gotas;
passadas e presentes,
e intuía o futuro olhando para cima,
à espera da próxima torrente.
E assim seguia o rio, e assim ondulava o mar;
contentores de todos os tempos.
Numa das curvas do rio, o fluxo se assoma de afluentes.
Convergem para o leito principal
linhas encontram o ponto de fuga.
Qual será a finalidade de tanta água;
tantos caminhos se sobrepondo?
O mar também se adensa,
atraído pela lua em maré alta.
Suas ondas transformam o espelho hídrico de outrora
em topografia, paisagens líquidas se apresentam
nas ondulações suaves.
E assim seguia o rio, e assim ondulava o mar;
na fase cheia do ciclo.
De súbito, revela-se o motivo de tanto volume.
A foz se aproxima.
Com o rio se alargando em delta
e o mar se estreitando em resposta;
ambos questionam como será o gosto desta fusão
o ponto de encontro entre a fertilidade do rio
e a transparência do mar.
o acre se funde ao azul,
limites são testados em silêncio
e neste ponto me encontro,
de encontro a fenômeno sublime
entre o curso do rio e a ondulação do mar.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

25/01/2009

Costumava ir ao leito antes de ser acometido pelo sono e então se iniciava o processo. Lâmpada apagada, a luminária anteriormente deixava o quarto todo rajado pela refração da luz no vidro canaletado. Saudosa esfera, magma do cubo branco.
Fazia esforço agora para contagiar a escuridão com esta memória, das listras luminosas nas paredes. Em vão.
Depois de meia hora, tempo suficiente para que a saturação negra atingisse seu ápice, o apertar de olhos, o vincar de dobras no rosto, começavam a produzir halos. Indagava se a maior profundidade do nada tinha essas cores secretas - não de luz, não de tinta, mas de pressão: uma pressão cromática no fundo de um nada.
Seu corpo envolto pelos tecidos transparentes mantinha-se estático agora que a transparência era maciez. “Ignore isso” pensava enquanto produzia redemoinhos nos lençóis, espirais de pano se proliferavam, auxiliares dos sonhos.
Uma pequena fuga surgia.
Seria possível desenhar a cartografia das janelas? A vista do seu quarto já bastava – o enquadramento dos batentes brancos detinha um bric-à-brac de janelas, lado a lado. Conhecia bem a segunda da esquerda do prédio bege. Morada de um homem e uma mulher que andavam pelo apartamento, sumiam e ressurgiam tão compenetrados em sua vida conjugal.
A janela da torre do hospital era um pequeno purgatório. Seu pai dissera ser uma sala de raio-X, daí a luz diferente que esta unidade emanava todas as noites.
O cume do arco gótico apontava para o próximo olho-mágico. Este, revelava uma escada desembocando num corredor branco; era a janela da espera. Alguns minutos tinham que passar antes que aparecesse um pequeno grupo de pessoas em volta de uma maca. E estas existências se resumiam apenas a tais instantes pois davam lugar à alva parede.
O que mais incomodava o garoto não eram essas ocorrências singulares, mas a sincronia tão improvável deste vasto grupo de ações desconexas: abrir a geladeira enquanto um corredor permanece inabitado e um homem é varrido por raios invisíveis e um garoto insone testemunha este mapa numa noite de 1991.